O Ser Assexuado

Mais uma vez envolvendo-me na pesquisa sobre o tema achei viável procurar as redes sociais por ser um lugar de tamanha diversidade e rotatividade além da preservação do anonimato dos respondentes.

Pesquisei em salas de várias categorias e abordei frequentadores com personalidades, idades e ideologias diferenciadas esclarecendo o meu objetivo.

Algumas pessoas me responderam com muita gentileza, outras não tanto, mas tudo para mim muito normal porque tudo faz parte do mundo virtual.

Nestes 05 dias de abordagem pude constatar que entre as 360 pessoas dispostas a responder-me apenas 60 pessoas conheciam o tema. Uma parte conheceu o tema através de reportagem exibida em uma rede de Tv, outros se inteiraram do assunto por conhecer ou ter conhecido alguém que dizia ser assexuado, outros por informações não mencionadas, e dos conhecedores do tema, apenas 03 assumiram ser assexuados, 02 mulheres e 01 homem.

É um tema ainda pouco comentado apesar de ser algo que sempre existiu. Podemos dizer que os assexuados conseguiram se esconder por longos anos e por várias razões.

A partir do século XXI novos motivos foram surgindo para que estes grupos de pessoas pudessem “sair dos esconderijos”. As novas tecnologias, as informações mais esclarecedoras e a própria internet possibilitou que assexuados se comunicassem entre si inicialmente sem serem identificados e assim consequentemente trocassem informações sobre o tema.

Os principais debates foram se tornando mais potentes e mais reais no inicio do ano de 2000 quando organizações tais como a Aven (Asexual Visibility and Education Network) oportunizou através das redes sociais que maior comunidade assexual on line pudesse se hospedar e dela obter uma gama maior de informações, informações verdadeiras e seguras, discussões abertas e honestas assim como um grande arquivo de recursos sobre o tema.

A assexualidade sempre existiu e caracteriza-se pela ausência da atração sexual pelo parceiro, característica esta que pode vir acompanhada pelo desinteresse pelas relações amorosas ou não.

O assexuado pode ser alguém que alimente o desejo de ter um parceiro, de viver e apreciar a intimidade, porém para ele o ato sexual e o amor são totalmente diferentes um do outro. O assexuado pode amar intensamente o outro sem cogitar o desejo de manter uma relação sexual o que não descarta também a possibilidade do uso da masturbação para saciar as necessidades orgânicas dos indivíduos.

A assexualidade não é uma disfunção sexual, as pessoas assexuadas não têm problemas psicológicos nem físicos, elas não têm baixa libido, os assexuados não são pessoas que sofrem ou sofreram maus tratos ou abusos sexuais e tão pouco são pessoas que buscam ao longo dos anos um parceiro exclusivo. Os assexuados ao contrario do que todos pensam são pessoas “normais” que fazem parte da quarta sexualidade, seguida pela hétero, homo e a bissexualidade.

Mesmo nos dias de hoje descobrir a assexualidade não é uma jornada simples, pessoas que ao longo dos anos foram se descobrindo contam que não foi tão simples, foi uma busca de intenso sofrimento e muitas das vezes humilhante, humilhante pela ignorância do conhecimento e até mesmo pela cultura social.

Diante das respostas obtidas dos pesquisados pude comprovar que a falta de conhecimento sobre o tema tem levado casais a situações extremas tais como brigas, desentendimentos e até mesmo separações.

É um fato real entender que pessoas com 40 anos ou mais nunca tenham ouvido falar sobre o tema, não se falava de sexualidade quanto mais de assexualidade.

Relatos reais contados pelos pesquisados comprovaram-me que muitos homens e também mulheres se casaram simplesmente pelo fato da necessidade de se formar uma família e seguir “as regras naturais” da evolução humana, nascer, crescer, se reproduzir e morrer. Apenas 01 homem foi sincero o suficiente ao me dizer que nunca sentiu desejo pelo ato sexual, que é casado a mais de 35 anos e que “agradeceu a Deus o fato de sua esposa ter entrado na menopausa e ter “perdido” a libido, fato para ele gratificante porque agora o casal mantém uma convivência sustentada pelo amor, pelo respeito e pela fidelidade de ambos”.

Um segundo homem me disse que observou que “algo não estava bem” aos 15 anos. “Naquele tempo meus amigos eram todos muito “fogosos” a puberdade aflorada fazia com que eles buscassem experiências sexuais em prostíbulos ou com alguma menina que “era mais dada” eu, no entanto não me sentia atraído pela prática sexual, confesso que havia outras muitas razões que me chamavam mais atenção.

Às vezes eu os acompanhava naquelas aventuras e um dia por influência de um deles resolvi conhecer o que eles chamavam de prazer, sinceramente foi a primeira e última vez que busquei por uma relação sexual. Por longos anos imaginei que eu pudesse não ser tão “homem” quanto meus amigos, mas depois de tanto buscar, de perguntas a especialistas encontrei meu perfil na assexualidade, confesso mais uma vez que não foi simples, fui muito discriminado, rotulado e até mesmo excluído de turmas por imaginarem que por eu não praticar o ato sexual eu seria menos homem do que eles.

Não me casei, namorei algumas meninas, encontrei uma que durante o namoro “a moda antiga” aceitava o fato de não praticar o ato sexual. Conversávamos muito até que um dia, depois de algum tempo de namoro tivemos que acabar porque ela queria ser mãe e eu “não podia dar a ela o que ela necessitava para a realização de seu sonho”

Não me sinto culpado, sou um jovem adulto que compreende a situação que me encontro, vivo em paz e tenho em outros objetivos o prazer que necessito”.

Duas mulheres anônimas confirmaram a assexualidade, uma relatou que quis conhecer o ato sexual mesmo sem ter atração alguma, mera curiosidade, teve um relacionamento e entre beijos e carícias resolveu experimentar, conta que não teve reação alguma e após a experiência se apavorava sempre ao imaginar a necessidade de novamente precisar “agradar” seu parceiro, diante de toda esta situação resolveu terminar o relacionamento, na época, conta ela, que toda família ficou revoltada com tal decisão e ela mesma não conseguia explicar o que lhe acontecia, diziam uns que ela tinha que se casar, outros que ela não podia ser lésbica, outros diziam que ela era “fresca” e outros tantos rótulos foram “pregados a ela” até que um dia diante de todo sofrimento  e já na idade adulta (2001) resolveu procurar ajuda encontrando em um sexólogo o que buscava, a comprovação de que haviam pessoas que não desenvolviam o interesse pelo ato sexual ao longo dos anos. “Foi um alívio conhecer minha realidade de perto, pois busquei ajuda nos médicos, fiz todos os exames necessários e nada foi constatado, hoje estou livre de preconceitos, comuniquei a toda minha família minha condição sexual, sou respeitada e sigo minha vida com tranquilidade e paz”.

A segunda mulher a se declarar assexuada contou-me que infelizmente ninguém até hoje conhece sua realidade, ela sente vergonha de se declarar assexuada, porque hoje está casada, tem filhos e netos, mantêm sua vida sexual “por obrigação” como sempre foi e declara que sempre lutou contra si mesma e a realidade que um dia conheceu através de uma psicóloga que a acompanhou durante algum tempo.

Muitos outros relatos foram ditos, muitas outras pontuações pude ler, algumas discriminatórias outras acusatórias, todas creio eu que seja pelo fato do julgamento sem conhecimento do que realmente é a assexualidade e o quanto ela necessita de ainda ser exposta para o mundo num mundo onde o sexo explicito e sem fronteiras avassala nossa humanidade como um comportamento  obrigatório à identidade tanto masculina quanto feminino.

Pouco se falava, pouco ainda se fala, porém hoje o tema é mais realista e mesmo que a proporção seja ainda pequena os assexuados estão ai e necessitam ser compreendidos e repeitados como qualquer outro indivíduo, eles necessitam ser tratados como pessoas comuns que são, pessoas sem patologias, sem neuras, sem medos, apenas pessoas com posturas e visões diferenciada da maioria.

Precisamos entender que a assexualidade não é uma opção, ninguém hoje acorda e decide não mais ter atração sexual por um parceiro, ninguém toma a decisão precipitada entendendo que o amor, o romantismo para eles é muito mais sublime do que o ato sexual.

Precisamos apoia-los não apenas por apoiar alguém que conhecemos ou amamos, precisamos apoia-los porque aprendemos a conhecer sobre a assexualidade e também porque compreendemos que deixa-los à margem pode causar muito mais dor e sofrimento do que a própria aceitação da condição sexual existente.

Pense nisso.

Gilwanya Ferreira

CRP 04-42417

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